Geraldo Augusto Pinto é Bacharel em Sociologia e Ciência Política (2000), Mestre em Sociologia (2003) e Doutor em Sociologia (2007), pelo Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas (IFCH/Unicamp). Em suas obras, destacam-se as temáticas referentes à reestruturação produtiva, com ênfase na questão do trabalho. Possui experiência prática em atividades de pesquisa, tendo atuado como assistente pesquisador e coordenador em diversos projetos. É professor adjunto do Departamento Acadêmico de Estudos Sociais da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (DAESO/UTFPR) e do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Tecnologia (PPGTE). É líder do Grupo de Estudos Ruy Mauro Marini (DAESO/UTFPR) e pesquisador dos grupos Organizações, Tecnologia e Trabalho (PPGTE/UTFPR), Trabalho, Educação e Tecnologia (PPGTE/UTFPR), Estudos sobre o Mundo do Trabalho e suas Metamorfoses (DS/IFCH/Unicamp) e Estado, Sociedade, Trabalho e Educação (CEL/Unioeste). É membro da Rede de Estudos do Trabalho (RET). Autor dos livros A organização do trabalho no século 20: taylorismo, fordismo e toyotismo (2. ed., Expressão Popular, 2010) e de A máquina automotiva em suas partes: um estudo das estratégias do capital na indústria de autopeças (Boitempo, 2011). 1 O texto em questão analisado do Autor será “De demiurgo a operário: Uma análise gramsciana do trabalho sob o taylorismo/fordismo”.
A palavra Demiurgo significa Artífice ou criador, divindade responsável pela criação do universo físico, segundo os gnósticos. Em trabalhos de Platão, cerca de 360ac, é uma divindade ou força criativa que deu forma ao mundo material.2 Assim Geraldo Augusto Pinto no texto “De demiurgo a operário: uma análise gramsciana do Trabalho sob o Taylorismo/ Fordismo” explica como o homem deixou de ser o criador do seu produto, para ser apenas uma parte da produção. Para isso o autor começa o seu texto descrevendo o cenário histórico que possibilitou o surgimento do Taylorismo/ Fordismo como um movimento de reestruturação do capital, indo além do âmbito da gestão do trabalho. O Taylorismo/ Fordismo como gestão de trabalho caracterizou-se da seguinte forma: produção seriada em massa, movimentos repetitivos dos operários, o controle do tempo morto, padronização dos produtos, verticalização e mecanização dos processos, fiscalização intensa e principalmente, a divisão técnica e social do trabalho. Todas essas medidas foram adotadas para um único fim : diminuir a relação do operário com os produtos da produção, para que se conseguisse obter um lucro excessivo. Para que tais métodos fossem consolidados era necessário um aparelho subjetivo que embasasse esta nova lógica, isto é tornar a atividade do trabalho do sistema capitalista como aspecto “natural” da vida humana, sendo que esta visão de trabalho inerente ao ser humano é presente no Marxismo Ortodoxo.
O Taylorismo/ Fordismo intensificou a exploração da classe trabalhadora, elevando a produtividade do trabalho e por conseguinte, a mais-valia. Contudo, quando implantado por Ford na sua fábrica, apresentou resistência e rejeição por parte dos sindicatos e trabalhadores. Com objetivo de reverter tal quadro, Ford demitiu os trabalhadores combativos e elevou os salários de $5 dólares por uma jornada de 8 horas. Tal estratégia permitiu “comprar” o trabalhador pela via econômica e pela subjetividade. Fica claro que o autor não considera o modo de produção capitalista como algo inerente ao ser humano, mas trata o ‘trabalho’ como forma de elevação do homem, e isto não é apropriado, pois existem sociedades que não tratam o trabalho em tal perspectiva.
Como se sabe, para Gramsci, o americanismo se baseia numa relação e redistribuição entre lucro, salário e renda profundamente diversa daquela do capitalismo do Ocidente europeu. Os altos salários e a consequente expansão da demanda permitem a ampliação de um mercado interno que não mais vê as rendas e o consumo improdutivo numa posição de grande relevo. Com relação ao capitalismo oitocentista e tradicional, baseado na repressão do salário e numa relação orgânica entre lucro e renda, o novo capitalismo americano desloca a renda para uma função marginal e coloca salário-lucro no centro do desenvolvimento econômico.3
A alienação acentuada no Taylorismo/ Fordismo consegue além de transformar o trabalho humano em mercadoria, tornar o ser humano um “apêndice” da máquina, ou seja, transformar o operário em mais uma “peça” facilmente removida e substítuida . Por exemplo, o artesão ao cortar um pano tem consciência do produto final e sabe de modo especifico a influencia daquele corte. Por isso, ele vai se orientar decisivamente naquele corte, a sua atenção e o corpo estarão conectados e focados no seu ato, ou seja o alfaiate não vai “cortar por cortar”. Assim, quando ocorre a alienação por meio de movimento repetitivos e divisão extrema dos processos de fabricação, o ser se desconecta do produto final, ele se desumaniza segundo Marx. Desta forma, é possível compreender o porquê de Ford preocupar-se tanto com o psicológico do trabalhador. O operário se desconecta tanto do produto, a ponto dos seus movimentos serem feitos mecanicamente sem a interferência da mente. Portanto, o psicológico do indivíduo precisava está sadio para não comprometer a linha de montagem, surge a necessidade de um “operário perfeito” com temperamento e personalidade adequados para conviver um longo período de abstração da sua própria vontade com saúde física e mental.
O Taylorismo/ Fordismo é a lógica que atinge o ínterim do ser, esquadrinha o âmago do individuo. Isto fica claro na relação dos operários com o padrão proposto pela Ford Motor Company. A condição “fundamental” para a existência dos trabalhadores eficazes era a estabilidade da vida social, como por exemplo, o apego á família, religião, patriotismo, a vida conjugal fixa, a repulsa ao álcool e as drogas. O verdadeiro objetivo de Ford ao influenciar na vida moral e social do trabalhador não foi motivada pelo espírito de compaixão, espiritualidade ou relação similar. A ideia principal era a construção de uma família industrial, no qual a vida social do trabalhador deveria seguir os padrões fabril, obtendo o máximo de auto- disciplinamento e exploração dos trabalhadores. Em síntese, a família tradicional foi substituída pela grande família industrial.
Era necessário para a manutenção do sistema Taylorista/ Fordista remover a influência dos sindicatos de ofício. Este sistema destruía a unidade de classe por incentivar a competição e o individualismo, apesar disto os sindicalistas ainda eram contrários á apropriação dos meios de produção, e principalmente o patrimônio de conhecimentos. O antigo sindicalismo profissional americano cuja base de operários qualificados ( artesãos) passou a ser acusada de pantear o conhecimento de ofícios em proveito próprio – a disputa sobre a “liberdade industrial”. O contexto da época era de risco, pois tudo transcorria paralelamente a experiência socialista da URSS, sendo que a crise de 1929 e a recessão seguinte viriam a por em duvida da eficácia do capitalismo enquanto forma de produção e de sociabilidade. Desta forma, era necessário manter a qualquer custo, o pacto entre capital e trabalho nas economias de mercado. Isto foi mantido através da experiência vivida no Estado de bem estar social, no qual foram concedidos certa garantia de direitos políticos e sociais ( moradia, educação e saúde). O Estado de Bem estar social (baseado na política econômica keynesiana) teve um impacto duplo na sociedade: primeiro, desestabilizou a luta da classe trabalhadora e concomitantemente permitiu um crescimento e o consumo em massa da produção.
Assim quando Ford implantou os altos salários e o controle ideológico, este conseguiu criar um cabresto para limitar a compreensão do operário sobre o sistema de produção e as imposições do sistema capitalista. Desta forma, o novo padrão de reprodução do capital possibilitou o reordenamento do grupo familiar em torno das atividades de consumo, ou seja os altos salários foram ‘seduzindo’ o operário como o Fetichismo da Mercadoria de Marx,4 dessa forma o salário deixa de ter a sua utilidade prática de sustento e passa a atribuir um valor simbólico, quase que divino. Assim o Taylorismo/Fordismo consegue comprar a subjetividade do indivíduo, faz com que este “vista a camisa da empresa”.
Geraldo Augusto Pinto escreveu : “ O fórceps fascista fez o parto do capitalismo fordista nas velhas economias europeias” . Esta frase deixa claro como o taylorismo/ fordismo se instalou na Europa, porém, a disseminação mundial deste sistema foi desigual, segundo David Harvey (1992). Pelo fato do Taylorismo/Fordismo ter se desenvolvido nos Estados Unidos foi o fator primordial para a sua hegemonia no âmbito econômico e político, pois os outros Estados-nações tiveram que acompanhar a sua produtividade, ou seja se submeter ao mesmo sistema de produção. Países periféricos, como o da América Latina tiveram que se moldar ao americanismo.
Gramsci enxergava no Taylorismo/Fordismo muito mais que um conjunto de métodos para organizar racionalmente determinadas atividades laborativas. Ou seja, não se tratava de um simples desenvolvimento tecnológico, mas uma combinação de princípios que coagia, persuadia e cooptava os trabalhadores para além de suas ações no ambiente de trabalho, conformando um modus vivendi útil á sua exploração pelas classes dominantes. Esta experiência além da fabrica possibilitou a formação de uma nova classe trabalhadora e de uma nova forma de cidadania – a industrialização em massa e o consumo em massa. Também, o Taylorismo/fordismo foi fundamental para a economia, a política e o poder americano, tornando este uma potência mundial. Dessa forma, sistema Taylorista/ Fordista ter sido substituído por outra forma de acumulação de capital , a busca de ofuscar aos sujeitos envolvidos – gerência e operariado- as contradições do assalariamento e da divisão técnica e social do trabalho é uma pedra angular da administração capitalista lançada por Ford e Taylor que estão presentes até hoje.
Referências
http://www.bv.fapesp.br/pt/pesquisador/60000/geraldo-augusto-pinto/
http://www.dicionarioinformal.com.br/demiurgo/
http://www.acessa.com/gramsci/?page=visualizar&id=283
http://www.infoescola.com/filosofia/o-fetichismo-da-mercadoria-na-obra-de-karl-marx/
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